Já deixei claro que estas anotações são puros exercícios de memória. A pretensão não é a de “trabalhar uma História das Artes Plásticas no Estado”. O que estou mostrando (rememorando) são fatos esparsos, ocorridos em anos diversos, que ajudam a compor o enorme xadrez dessa realidade.
Meu olhar aqui colocado e interpretado é o do jornalista que, por ser muito moço então – e a tudo querendo sorver do mundo que se lhe abria – foi absorvendo fatos especiais com uma certa sofreguidão.
Este apanhado jornalístico faz, então – para repetir uma palavra chavão – o ‘resgate’ de certos feitos esquecidos. Mas que foram extremamente significativos para dar às artes visuais do Estado a dimensão que elas têm hoje.
OS MURALISTAS
Assim, garanto que um dos feitos mais significativos daqueles anos 1960 foi a majestosa mostra dos muralistas mexicanos – Siqueros, Tamaio, Rivera, etc. – que ocorreu na Biblioteca Pública do Paraná.
Eduardo Rocha Virmond, com o apoio indispensável de Ennio Marques Ferreira, atendeu à missão que lhe apresentara Adherbal Stresser, o preposto de Assis Chateaubriand no Paraná, diretor local dos Diários Associados.
Domício Pedroso, que há poucos anos perdemos, um pintor de enormes qualidades, essencial na pinacoteca paranaense, era também um especialista na montagem de exposições, tarefa que conhecia como ninguém. Ele trabalhou duro no projeto. Tinha a apoiá-lo o Santoro, o Clemente Horochowiski, o Milton Cavalcanti, este, dono de uma sabedoria popular encantadora. Eles formavam o grupo do BADEP, funcionários que reuniam qualidades de técnicos de muitas áreas à vocação para a montagem de exposições, conferências, cursos, publicações.
Fernando Velloso esteve também entre as peças essenciais para a montagem daquela oportunidade irrepetível, a presença de obras dos imortais mexicanos entre nós.
DESISTÊNCIA
O trabalho de logística foi hercúleo, como me contou, certa vez, o próprio Virmond. Houve dificuldades imensas, especialmente com a necessidade de compatibilizar o pé-direito dos salões com a altura dos murais. Num dado momento, embora avaliando o grande presente que seria a exposição franqueada pelo Museu de Arte de São Paulo, o pessoal do Paraná chegou até em pensar em desistir da exposição, diante das dificuldades surgidas.
No fim, tudo saiu bem. Ponto para a História das Artes Plásticas do Paraná.
Nos anos 1960, felizmente, uma nova geração de artistas plásticos ia se firmando, ganhando mercado, sendo aceito por uma cidade – Curitiba – que ia rapidamente se verticalizando e passava a receber homens e mulheres com poder econômico. Esse pessoal trazia fortunas especialmente do Norte e do Oeste/Sudoeste do Estado, e começou a comprar artes, incentivado em boa parte por arquitetos de interiores e decoradores, a investir em artes plásticas. Foi quando, estando bem à vista desses potenciais compradores, João Osorio, Juarez Machado (que ficou aqui até 1965), Fernando Calderari, Helena Wong, Jair Mendes, Mário Rubinski, Wilson de Andrade Silva (“Espigão”), Waldemar Rosa, Cheval, Ronnes Dunke, Luiz Carlos de Andrade Lima – dentre outros – passaram a sentir a existência de um verdadeiro mercado: havia gente querendo e podendo comprar artes.
DECORADORES
Acredito que os arquitetos Rodolfo Doubek e Julio Pechmann, assim como a decoradora Eleonora Valente, foram capitais naqueles dias, ajudando a apontar nomes, a educar futuros colecionadores ou, simplesmente, endinheirados que descobriam o fantástico mundo das artes visuais. Mais tarde, nos anos 1970, Judy Guelmann consegue firmar-se como uma das decoradoras mais procuradas pela elite econômica do estado.
No começo dos 1960, trabalhando com meu amigo Dino Almeida, na histórica Revista Clube, fui pelo menos umas 3 vezes almoçar na residência do engenheiro Darci Gomes de Moraes e sua esposa, dona Lourdes, onde tive contato, pela primeira vez, com obras de arte de grande valor lá expostas.
Darci era um homem de bom gosto e culto, não “comprava quadros por metros”, como então diziam algumas línguas viperinas a propósito de “nouveaux riches” encantados com suas descobertas pictóricas, cujos preços alardeavam em bom som.
(PROSSEGUE)
Artes plásticas do Paraná no século 20 (1ª parte)
Artes plásticas do Paraná no século 20 (2ª parte)
Artes plásticas do Paraná no século 20 (3ª parte)
Artes plásticas do Paraná no século 20 (4ª parte)