Por Katia Michelle* – Sou do tempo do guaraná com rolha. Sou do tempo da fita cassete. Tive um ampliador e revelava minhas próprias fotos. Sou do tempo em que se rebobinava filme com a caneta. Sou do tempo em que o Rubão era Rubão, e não Rubens Burigo. Isso foi lá nos tempos da Folha de Londrina. Ele tinha uns óculos prateados (posso provar) e já tinha nascido Rubão. Foi antes de ele se aventurar pelas janelas da GRPCOM, da Rede Massa e da RIC. Algumas televisões com botões ainda chapiscavam nas casas. Não posso provar, mas acho.
Certeza mesmo eu tenho que, além de ele ser um baita profissional, ainda brilha na cozinha. Posso provar. Há algumas semanas, reuniu amigos da Folha em torno da sua famosa feijoada, preparada a quatro mãos com a amiga Vanessa Xavier. A ocasião era a recepção da jornalista brasileira mais australiana que existe, a Luciana Fraguas.
Não gosto de feijoada, mas a do Rubão é diferente. Ele conta que a receita não é de família, mas de observação. Porque cozinha também é assim. Se faz com olhos e bocas. De tanto olhar e comer, Rubão já comandou as panelas da feijuca algumas vezes, cozinhando para mais de 30 pessoas. Haja boca. Haja olhar.
Para uma boa feijoada, ele garante, é preciso usar carnes defumadas, de boa procedência, “gordinhas”. “De preferência do mesmo fornecedor ou marca. Não pode faltar o kit completo de orelha, rabo e pé de porco pra ter colágeno e dar aquela textura cremosa no caldo”, me disse.
E continua: “O feijão preto também é mega importante ser de qualidade boa. Se der pra comprar o orgânico, muito melhor”. O segredo do prato também está no cozimento. Lento, lento. “O ideal é fazer no dia anterior, à noite, para servir no dia seguinte”. Quantidade? O olho volta a liderar. “Vai depender do volume de feijoada, calculada pelo número de pessoas – a maioria fala em 500g, 600g por pessoa. Eu acho meio exagerado, mas é bom ter a sobrinha para marmita depois”.
Para quem tem dúvida e gosta da sequência correta, a ordem sempre é selar as carnes com alho e cebola e depois colocar o feijão. Ir mexendo e sentindo o quanto o caldo vai engrossar. O que não pode faltar de jeito nenhum é o básico, que esse sempre é bem-vindo: cebola, alho, louro, pimenta-do-reino e sal. Não dá para esquecer de dessalgar as carnes.
Para acompanhar, torresmo, farofa, laranja, couve com bacon, vinagrete com e sem pimenta dedo-de-moça, com e sem coentro (amo). E pimenta, sempre, sempre. É difícil? É sim. Eu mesma nunca me aventurei nem no feijão nosso de cada dia. “Feijoada é difícil de fazer porque leva tempo no preparo e a escolha dos insumos influi demais no gosto e no caldo da feijoada. Tem que ser sempre produtos de primeira. É inegociável. Não dá pra fazer comida boa sem investir em insumo bom”, ensina o Rubão, Rubens, Burigo, ou como você quiser chamar. O bom mesmo é chamar o cara para fazer a feijoada. Se ele está disponível? Não sei, mas vai que…
*Katia Michelle é jornalista formada em Comunicação Social e bacharel em Artes Cênicas. Trabalhou durante uma década na Folha de Londrina, passou pelo marketing de grandes empresas e foi editora na Gazeta do Povo. Aprendeu que comida é mais do que a junção de ingredientes e, desde então, vaga entre palavras e receitas, procurando o léxico, o sabor e o aroma perfeitos.