Novos flagrantes, meros flagrantes, mas que falam bastante sobre parte da fauna humana que forma Roma na Primavera. É gente de todo tipo, italianos e estrangeiros; dentre esses, alguns indocumentados – ilegais, portanto – outros, estrangeiros também mas com direito de trabalhar no país que vive, como a grande maioria dos membros da Comunidade Europeia, tempos “terribilis”. Com desemprego e baixo crescimento. Pode haver pior binômio?
Essas ‘fotos’ que agora seguem foram captadas por mim, de 26 de abril a 2 de maio, na Roma dos Césares, a Cidade Eterna, onde o histórico, o celeste e vida à grande convivem. Em certas ocasiões, até com todas as contradições, como as das fitas de Fellini e Antonioni.
Até por isso, não me sai da cabeça o curto e precioso contato com o padre X, da congregação dos Padres Teatinos, que estudou filosofia e teologia no Brasil, com os beneditinos, em São Paulo, sendo dono de um português impressionantemente bom e sem sotaque.
Alugou a fachada
Pois esse Padre X, cujo sobrenome termina por Berg, holandês, confessadamente ‘bom de comércio’ deu-me exemplo de quanto alguém pode defender o patrimônio cultural sem ficar mendigando recursos públicos, prática comum na Itália, tanto como no Brasil.
Cansado de ver sua Igreja de Santo Andrea Del Valle sofrer a deterioração do tempo, especialmente a deterioração de seu milionário acervo de obras de arte, o sacerdote foi à luta: “Consegui, depois de muita negociação, alugar por dois anos a fachada do templo para uma agência de publicidade. O espaço foi tomado por anúncios, mas o aluguel rendeu 100 mil euros/mês”, garante.
Com a receita gerada pela fachada/outdoor, promoveu a milionária restauração do templo. Ele fica num dos pontos mais valorizados do Setor Histórico de Roma, próximo à Torre Argentina e com acesso, em linha reta, à Piazza Navona, que exerce impressionante fascínio sobre a alma de romanos e turistas. É onde está um pedaço de território brasileiro: o Palácio Doria Pamphilia, endereço da Embaixada do Brasil.
Mas não se pense que é só chegar e ganhar direito a visitar esse patrimônio cultural da Itália, o Doria Pamphilia, museu.
Há que se agendar visitas na embaixada, com antecedência e via web.
Os gatos de Roma
A Torre Argentina é um centro distribuidor de transporte via ônibus e bondes. Mas nada a ver com os caóticos terminais urbanos do Brasil. Tudo com ordem, apesar de o espírito ordeiro não ser o melhor traço dos italianos em muitos outros setores da vida diária.
Ali na Torre Argentina, acabo contemplando mais uma das tantos vestígios de outras épocas, centenárias, devidamente catalogadas como patrimônio público. Até aí tudo bem, nem me surpreendo muito. A surpresa fica por conta de constatar que havia descoberto, enfim, uma das melhores moradas dos gatos de Roma. São 300 bichanos que vivem, com ou sem pedigree, em meio àquelas ruínas cuidadosamente catalogadas por arqueólogos.
Os gatos de Roma são paradigmáticos da cidade, com direito a calendário. O de 2015 flagra eloquentes e preguiçosos bichanos, e pode ser comprado em qualquer banca de revista. Batas pedir pelos “Gati di Roma”.
Lembrei de meu amigo Antonio Carlos Costa Coelho, professor do Studium Theologicum de Curitiba, que sempre citava o sonho dourado de um colega seu, padre espanhol, que às vezes se desligava do mundo, reclamando em voz alta: “Quero ser um gato de Roma”. (Segue na edição de amanhã).