segunda-feira, 9 junho, 2025
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O dia em que Ney Braga quase foi presidente

Oscar Alves (Foto: Annelize Tozetto)
Oscar Alves (Foto: Annelize Tozetto)

Genro de Ney Braga, correligionário, ex-deputado federal, ex-secretário de Saúde, ex-reitor da UEL, médico, Oscar Alves é também um professor de história. Ao menos da história que viveu ou foi testemunha. Sua entrevista ao livro “Encontro do Araguaia”, organizado por este jornalista, é prova disso.

Preside o Conselho Estadual de Educação, atualmente.

Em 1960, Alves foi um entusiasta de primeira hora da campanha de Ney Braga ao governo do Paraná. Para Ney, tratava-se de um teste, porque não tinha ele maiores pretensões. Fora prefeito de Curitiba, sim, mas era de origem modesta, sem grandes recursos para bancar uma campanha ao governo, nem atrair para si os ricos que gravitavam em torno de outros candidatos. O de mais chance era Abilon de Sousa Naves, porque fora ele quem, como diretor da Carteira de Crédito Agrícola do Banco do Brasil, criara incentivos para os produtores e a vocação do Paraná àquela época era essencialmente a agricultura.

MORTE PREMATURA

Às vésperas da campanha, que já se dizia vencedora, Sousa Naves, aos 54 anos, sofreu um infarto fulminante enquanto discursava. Foi fatal. Não há registro de acontecimento semelhante no país. Se houve não se tratava de político de tal envergadura. O “treino” a que Ney Braga se habilitava, então, transformou-se em uma competição real, com possibilidades palpáveis e uma vitória insinuando-se no horizonte. Ney convocou a Juventude Democrática Católica, da qual faziam parte Oscar Alves (presidente no estado) e José Richa (presidente nacional) e tratou de distribuir-lhes tarefas no interior do estado, principalmente no Norte, onde carecia de votos. Foi bem sucedido. Elegeu-se governador, contra todas as expectativas e promoveu a primeira grande transformação do Paraná. A obra mais lembrada é a Rodovia do Café, que ligou o Norte do Paraná a Curitiba. Mas, segundo Oscar Alves, essa foi apenas uma centelha das realizações que, hoje, são marcas indissociáveis do governo Ney Braga.

QUEM É JÂNIO, É NEY

Eram tempos estranhos. Ney era um membro do Exército – àquela época um major que já havia ocupado a Chefatura de Polícia do estado, hoje Secretaria de Segurança Pública –, mas não um conspirador. No mesmo ano em que concorreu ao governo, Jânio Quadros fazia sua campanha inusitada à presidência da República. No Paraná, o PTB e o PDC disputavam o apoio de Jânio. Ao vislumbrar uma turba de apoiadores dos dois partidos no aeroporto Afonso Pena, Jânio temeu, recuou e, dizem historiadores, viu-se atabalhoado por causa dos efeitos visíveis de um pileque mal curado.

A turma do PDC, no entanto, não se fez de rogada. Haviam inventado um jingle que tocava nas rádios: “Quem é Jânio, é Ney. Quem é Ney, é Jânio”. Quando o candidato surgiu à porta do avião, prestes a desabalar pelas escadas, membros do PDC espremeram-se nos degraus e deixaram-no tombar, trôpego. Jânio quase caiu, mas foi sustentado a tempo. Então o seguraram firmemente e fizeram surgir à sua frente um Ney Braga espremido entre a multidão. Foi assim que a imprensa da época registrou o abraço entre Jânio e Ney. Um abraço pouco natural entre políticos, mas quem disse que existe abraço natural entre políticos?

RENÚNCIA E CAOS

Com a renúncia de Jânio, ocorrida sete meses depois de sua posse, em 25 de agosto de 1961, Ney foi um dos primeiros a cerrar fileiras garantindo a posse do vice, João Goulart. O PTB, partido de Jango, era maioria na Assembleia do Paraná. O PDC era seu aliado. E o governo do vice garantia investimentos ao Paraná. Não havia porque mudar. E não mudaria se, de acordo com Oscar Alves, Jango não permitisse que sargentos e cabos convocassem greves, que formassem sindicatos e atentassem, assim, contra a hierarquia e a disciplina do Exército. A tudo isso, somou-se o tresloucado comício na Central do Brasil, em 13 de março de 1964, dando mostras de que estava ali um novo ditador socialista, pronto a atender o clamor das classes populares.

Em entrevista pouco antes de falecer, o general Ítalo Conti, ex-secretário de Segurança Pública de Ney Braga, insinuou que o governador era um golpista de primeira hora. Não era. Alves diz que ele só veio a concordar com a intervenção militar quando o quadro já se deteriorara. “Houve uma reunião em 29 de março, em Belo Horizonte, na casa do Magalhães Pinto, em que Ney esteve presente. Ali, selou-se o destino de Jango ou pactuou-se o que viria a ser o desencadeamento do golpe”, afirma.

NEY CANDIDATO A PRESIDENTE

Se Ney Braga era um integrante da “linha dura”? Não. Era um castellista. Alinhava-se com as ideias do Marechal Castello Branco (marechal porque fora pracinha na Segunda Guerra), cuja intenção primária era pacificar o país e devolvê-lo aos civis. Com sua morte trágica em um acidente de avião, as nuvens cinzentas voltaram a tomar conta de Brasília e o Colégio Eleitoral – composto de senadores, deputados federais e… oficiais superiores – elegeu o temido Costa e Silva. Ney Braga também foi candidato, mas saiu de lá derrotado e com a marca de oponente pregada na farda militar.

De acordo com Oscar Alves, daí veio o ostracismo a que Ney foi submetido durante as décadas de 60 e 70. Em 1965, houve uma denúncia de que ele mandara publicar anúncios oficiais do governo no “Última Hora”, o último jornal de oposição ao regime que ainda resistia. Foi denunciado e ameaçado de cassação. Por fim, pouparam-lhe o castigo.

OUTRA VEZ QUASE PRESIDENTE

Só com a ascensão de Ernesto Geisel à presidência, é que Ney foi reabilitado. Geisel era um amigo de longa data. Fora comandante da 5ª Região Militar, em Curitiba, e construíra uma amizade sólida com o ex-governador. Ney Braga dividiu com ele o papel de fiel escudeiro e também de conselheiro. Quando Geisel estava prestes a concluir o seu mandato, em 1978, acenou com a possibilidade de fazer Ney Braga seu sucessor. Desistiu da ideia por causa da ameaça de golpe do general Sylvio Frota. Foi então que optou por João Baptista Figueiredo, o ex-chefe do SNI, que transitava com desenvoltura pelos dois grupos antagônicos do Exército.

Ney alçou o seu último voo como governador do estado, nomeado que foi como o último mandatário do Paraná por via indireta (1979-1982). Sucedeu-o José Richa, aquele dirigente da Juventude Democrática Cristã que, no início dos 60, ao lado de Oscar Alves, fora encarregado de pavimentar sua candidatura. Eram amigos. Nunca deixaram de ser.

CLETO DE ASSIS

Cleto de Assis, secretário do Conselho Estadual de Educação, companheiro de lides políticas universitárias de Oscar Alves em Curitiba, participou da entrevista ao lado de Celso Nascimento, Marcus Vinicius e este jornalista.

Cleto foi assessor direto de Ney por muitos anos, e seu secretário de Imprensa no segundo governo do modernizador do Paraná. Mais tarde seria diretor do MEC, no Governo de Itamar Franco.

Oscar Alves (Foto: Annelize Tozetto)
Oscar Alves (Foto: Annelize Tozetto)
O grupo de entrevistadores – Marcus Vinicius Gomes, Cleto de Assis, Celso Nascimento e Aroldo Murá G.Haygert com Oscar (Foto: Annelize Tozetto)
O grupo de entrevistadores – Marcus Vinicius Gomes, Cleto de Assis, Celso Nascimento e Aroldo Murá G.Haygert com Oscar (Foto: Annelize Tozetto)
A entrevista com Oscar Alves, também gravada em vídeo, prosseguiu durante o almoço. (Foto: Annelize Tozetto)
A entrevista com Oscar Alves, também gravada em vídeo, prosseguiu durante o almoço. (Foto: Annelize Tozetto)
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