quarta-feira, 4 dezembro, 2024
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Memória de jornal (3ª parte): quem matou “Santantonio”?

Por Hélio de Freitas Puglielli

Na tentativa de dobrar o minguado salário, em 1958, tento acumular as funções de redator (na verdade, copy-desk) à noite e de repórter à tarde.

Inexperiente, numa época em que não havia a elaboração de pautas, dependo das “dicas” orais do Milton Camargo de Oliveira, chefe de reportagem de “O Estado do Paraná”. Já prejudicado pelo alcoolismo, Milton é excelente pessoa, mas como profissional não tem condições de abrir trilhas nem para clarear horizontes que facilitem meu trabalho na reportagem. Por isso vejo chegar a minha hora de invadir a área policial quando um motorista de táxi é assassinado na autoestrada Curitiba-Paranaguá, ainda em construção e sem a designação de Br. Num local nas imediações de onde atualmente se ergue a fábrica da Coca-Cola, a vítima havia sido encontrada dentro de seu veículo, semi-degolada. Esqueci o nome. Mas o apelido do motorista era “Santo Antônio” e vivia nas manchetes do noticiário policial, pois várias pistas foram seguidas e sucessivamente abandonadas. Não me recordo se por iniciativa própria ou por sugestão do Milton, mas certamente com o seu beneplácito, acabei “entrando no caso”, como se dizia.

Ouvi delegados, fui investigar “in loco”, falei com os moradores da vizinhança, na verdade habitantes de alguns casebres à beira das obras da estrada. Havia lido muitos romances e imaginava que as pessoas fossem como personagens e que delas fosse possível extrair elementos mediante a análise fisionômica, ou fisiognômica, os olhares, as variações da voz, afetada por alterações psicológicas, etc. etc. Com relação às coisas inanimadas, observava tudo, cada pedrinha do trecho da estrada em que fora encontrado o veículo, fuçava no capinzal em busca de algum objeto ou sinal deixado pelo assassino, buscava pegadas que pudessem ir em alguma direção, inclusive na direção de algum dos casebres.

No interior deles tentei ver se havia algo que parecesse ter pertencido à vítima. Tudo na esperança de achar a pista que ninguém tinha descoberto, tudo com a convicção de que os repórteres policiais estavam ancorados na rotina e não tinham condições intelectuais para alçar um voo maior, em busca da decifração do mistério. Levei dias procurando pistas, mas não achei nada de novo, embora tendo redigido vários textos evasivos, ainda alimentando ilusões.

Tive, enfim, de pôr um ponto final em minhas pretensões e encerrar o “assunto Santo Antônio”.

Poucos meses depois encerrei também minhas atividades como repórter. Até hoje ninguém sabe quem matou “Santo Antônio”.

(PROSSEGUE)

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