quarta-feira, 11 setembro, 2024
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Distúrbios na França podem trazer vantagem para ultradireita

Agência DWMesmo que pouco a pouco a violência nas ruas pareça estar amainando, não se pode falar de normalidade nas cidades da França. Depois que Nahel M., de 17 anos, foi morto por um tiro em 27 de junho, durante uma blitz de trânsito no subúrbio parisiense de Nanterre,cólera contra o Estado e suas instituições irrompeu em diversas localidades. Ainda mais depois que um vídeo divulgado nas redes sociais mostrou inequivocamente que o policial não agiu em legítima defesa.

A violência se descarrega sobretudo contra os símbolos da república, postos policiais, escolas e prefeituras. O clímax, até o momento, foi o ataque à residência do prefeito de L’Haÿ-les-Roses, na área metropolitana de Paris, onde desconhecidos romperam o portão com um veículo pesado, ao qual atearam fogo, assim como ao automóvel da família.

A esposa do político ficou ferida ao tentar escapar com os dois filhos pequenos. A Justiça abriu inquérito por tentativa de homicídio. Nesta segunda-feira (3), o incidente suscitou manifestações de solidariedade diante diversas prefeituras municipais.

Já houve mais de 3 mil detenções desde o início dos distúrbios na França. Um dos principais potenciais beneficiários desse caos é o partido de ultradireita Reunião Nacional (RN).

Contudo a solidariedade está longe de ser unânime: ao mesmo tempo que prestou seus pêsames no Twitter, Eric Ciotti, do conservador Os Republicanos (LR), ressalvou que se devia esperar o resultado do inquérito antes de se condenar o policial.

Manifestantes da França
Foto: Yves Herman/REUTERS

Já dois dias depois do assassinato de Nahel, o político exigia, diante dos distúrbios, que o governo declarasse estado de emergência. Este confere amplos poderes às autoridades, por exemplo, para restringir a liberdade de reunião ou realizar batidas domiciliares.

Nesse ponto, Ciotti foi até mais longe do que Marine Le Pen, candidata da RN nas últimas duas eleições presidenciais e agora chefe de bancada do partido na Assembleia Nacional. Apesar de tachar as declarações de Macron de “excessivas” e também insistir que se esperasse os resultados das investigações contra o policial, a ultradireitista se pronunciou contra o estado de emergência, que só pioraria a situação.

Extrema direita de Le Pen

Para Benjamin Morel, professor de direito público da Universidade de Paris Panthéon-Assas, trata-se de uma “estratégia da gravata”, parte da tentativa da RN, há anos, de se mostrar moderada: “Por toda parte eles vestem paletó e gravata, por exemplo na Assembleia Nacional, e não chamam mais a atenção, como antes, com declarações muito radicais. Na atual crise, a RN está quase na mesma linha que Macron.”

Motivo para tal seria que “na França – ao contrário de outros países, como, por exemplo, a Alemanha – eles não podem chegar ao poder através de coalizões”: a RN teria que ser a número um nas eleições presidenciais, “e por isso precisa atrair muitos eleitores para o seu lado”.

Isso não impede certos políticos da legenda de ultradireita de seguirem adotando a linha-dura, observa o cientista político Gilles Ivaldi, do centro de pesquisa Cevipof, do Institut d’études politiques de Paris. Um deles seria o líder partidário Jordan Bardella.

O também descendente de imigrantes de 27 anos condena a “brutalização da sociedade, em consequência de uma política de imigração totalmente desvairada”, e promete deportar todos os “criminosos estrangeiros”, caso a RN vença as presidenciais de 2027.

“O partido persegue uma estratégia dupla, atendendo tanto a seus eleitores tradicionais extremistas, quanto a potenciais novos eleitores preocupados com a própria segurança, que agora, através de Le Pen, veem na RN um partido aparentemente aceitável, que restabelecerá a ordem”, analisa Ivaldi.

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