
Há oito anos, quando os fariseus diziam que Dalton Trevisan rondava o limiar da vida – logo ele, sem um pneu furado –, o fulano de tal fez das suas. Escalado para escrever uma crítica do livro ‘Desgracida’ em revista literária, esta sim finada, fez o que sabe fazer toda peçonha sem caráter: sibilou em doze tons.
O RASTRO INDELÉVEL QUE O BODE DEIXA ATRÁS DE SI
O tal fulano se diz escritor. Se diz também professor e reitor que nunca foi. É desses acadêmicos que saem dizendo por aí: ‘minha vida é minha biblioteca’. Bem a medida do rastro indelével que o bode deixa atrás de si. Assim caminha a mediocridade. Pois fulano de tal vaticinou: “Dalton, pois sim, é vampiro quando lhe convém. Em outros tempos cultivou vida literária intensa. Na década de 40, foi um dos centros periféricos da cultura nacional”. Centro periférico?
BARATINHA LEPROSA
Entenda-se a década de 40 do tal fulano por anos 40 – de 41 a 50, pois não. Dalton, então com 22 anos, desembarcou no II Congresso Brasileiro de Escritores, em Belo Horizonte, e pronto, fez-se mais rente que pão quente em saraus. Fulano de tal fala de si mesmo. Fala do personagem que ele é, baratinha leprosa dormitando no vão dos assoalhos. Roendo migalhas. Regurgitando.
AH, O ESPOCAR DOS FLASHES
Há então, e o artigo diz, um vão no espaço-tempo de duas décadas, mas o tal fulano o ignora. Lá está ele, lembrando que, aos 43, Dalton concedeu entrevista ao Jornal da Tarde e insistiu para que o repórter incluísse no texto o nome das duas filhas. Gostou também do espocar dos flashes e do resultado das fotos. “Puxa, não é que estou bacana aqui?”
RECLUSO POR CONVENIÊNCIA
Sugere então que, a partir do sucesso de ‘Essas Malditas Mulheres’, em 1982, Dalton torna-se um recluso conveniente. Tinha o vampiro 57 anos e, a essa altura, um faro infalível para o marketing. Pois J.D. Salinger não fizera o mesmo? Fulano de tal foi mais longe (e essa gente não tem limite mesmo): o escritor decidira afastar-se do mundano convívio literário para que pudesse fugir ao confronto direto de pessoas reais das quais servira-se e lambuzara-se ao construir personagens nada agradáveis. Fala do caso da professora mestranda, que lhe surrupiou a correspondência enviada ao amigo, fala de um certo Edu que lhe levou cheque em branco, e até poderia falar da dona que incorporou a Capitu de certo conto. Só não apontou, o tal fulano, o dedo do Judas a si mesmo.
Hiena papuda, hiena papuda. “No teu coração pesteado rondam os lobos da inveja. Na tua alma leprosa uivam os chacais da infâmia”. Vixe!
NOSTÁLGICO INCURÁVEL
Dureza mesmo é que o cara, ó Cara, vê em Dalton um nostálgico incurável, devoto da literatura “leve, lírica, erotizada, fiel aos pequenos nadas da vida”. Dickens não. Hugo não. Salinger não. Ora, ora fulano.
ÍNTIMO DO CAFÉ E DA BROA
Entranhas em fogo, o tal fulano compartilhou do café, da broa, da intimidade e do humor iconoclasta do escritor que é, foi e será o que ele jamais. Nos fundilhos. Leve? Pois não foram os livros de Dalton proibidos em escolas públicas contaminadas por um moralismo que compactua com o do fulano de tal obtuso?
PARA QUEM NÃO MERECE O TRAPO
Lírico? Nada contra o lirismo, mas não há lirismo em Dalton. Não quando o terceiro quirodáctilo rompe a fina proteção da calcinha orvalhada. Tá bom, é lírico. De-lírico. E nem demos pano a quem não merece o trapo. Se a comunidade literária (ei Teatro Paiol) dá voz a essa gente, dez pragas do Egito são pouco. Jornal literário? Rascunho do Inferno.
IAGO INVERTEBRADO
O tal ainda fez mais. Ao mesmo tempo em que aspergia o artigo com as insinuações do Iago invertebrado, fazia publicar um livro que a editora definiu como ‘romance de formação’. O tal, coberto de chaves de leitura, apresentava, suja e porcamente, o personagem Geraldo Trentini, calcado em Dalton – pois o T do sobrenome não é o mesmo?
COVIL DA CONFEITARIA
Aos olhos do safo jacu, o velho de mãos trêmulas e insinuosas amparava-se na fama para atrair a companhia de meninas tenras, broinha de fubá mimoso, ao covil da Confeitaria Schaffer.
ÀS CUSTAS DO REI
Há uma razão para o livro do tal fulano receber, em pouco tempo, a fina camada de poeira da indiferença. Coisa pior não existe para quem se julga homem das letras. Como é que é? Vida em meio aos livros? Que imagem desgastada. O risível no fulano de tal é que a devoção pelo convescote literário e não pelo trabalho dedicado, o tornou protagonista de constrangimentos que são Top Ten em qualquer rodinha dessa gente que põe o dedo indicador no lábio antes de enfiá-lo inteiro no nariz. Em uma dessas ocasiões, ele publicou as cartas que trocou com a sua primeira namorada (depois mulher), em edição às custas do rei. Acreditava, por certo, que um dia elas seriam consideradas os primeiros esforços de um procto-escritor destinado à eternidade. Traças, regozijai-vos!
P.S.: Ei fulano de tal, o roman à clef é por conta da casa.