sexta-feira, 6 junho, 2025
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OPINIÃO DOS OUTROS: A BARCA DE PEDRO

A Igreja e a esquerda…

Por Antenor Demeterco Junior (*)

Mesmo para os descrentes, a Igreja Católica tem, reconhecidamente, um patrimônio histórico invejável: criou uma civilização ocidental extraordinária após a queda do Império Romano, inventou a universidade e os hospitais, inspirou ou financiou as maiores obras de arte do mundo, forneceu o mais poderoso entrave da história ao poder irrestrito do Estado, inventou a ciência moderna, desenvolveu a arte da construção com as grandes catedrais europeias, obras das fraternidades obreiras de auxílio mútuo.

A democracia muito deve ao Catolicismo, pois havia eleições nos clubes ingleses advindos destas fraternidades medievais, como informa o historiador Peter Burk.

 

KISSINGER RECONHECE

Henry Kissinger, em suas memórias, afirma categoricamente que a sua contribuição para este regime foi grande, com a separação da autoridade entre Deus e Cesar, primeiro passo pra o pluralismo político e para a limitação do poder do Estado.

As tradições papais sempre tiveram o comunismo em baixa conta já no século XIX, antes portanto, de sua experimentação social-econômica frustrante, e do pouco valor que seus corifeus deram e dão à vida humana.

 

“QUI PLURIBUS”

Pio IX (1792-1878) condenou-o em sua encíclica “Qui pluribus” de 9 de novembro de 1846 (“aquela nefanda doutrina”), e Leão XIII (1810-1903) na encíclica “Quod Apostolici muneri” de 28 de dezembro de 1878 (“peste destruidora”).

No Brasil do século XX, para citar um exemplo, as velhas lições papais foram esquecidas, quando jovens freis dominicanos integraram-se na aventura armada que se propôs a derrubar o regime militar vigente (cf. “Marighella” de Mário Magalhães, p. 530-531), dando cobertura e aliando-se ao terrorista Marighella, usando seus conventos como refúgio de guerrilheiros perseguidos, escondendo armamentos e dinheiro dos mesmos, e arregimentando secundaristas para as suas fileiras.

 

SEGUNDO PLANO

Esta tendência em deixar para segundo plano a Religião e engajar-se em política esquerdista é hoje dominante em certos setores da Igreja Católica sul americana, o que ajudou a esvaziar seus templos.

Ex-católicos afluem em massa para as diversas igrejas evangélicas, hoje detentoras da defesa de costumes conservadores.

O fenômeno ocorre também nos Estados Unidos, após o Concilio Vaticano II, onde 40% dos americanos adultos que foram criados católicos deixaram a Igreja e não retornaram (in “Manual Politicamente Incorreto do Catolicismo”, de John Zmirak, p. 71).

 

CONTRA CAPITALISMO

Em meio a sangria do rebanho, o cardeal italiano Edoardo Menichelli anunciou que a Igreja sob o Papa Francisco estava iniciando “uma luta conta o capitalismo, similar àquela contra o comunismo, que ocorrera sob o Papa São João Paulo II (ibidem, p.130).

As preocupações com as injustiças do capitalismo substituem o enfoque dos principais problemas internos da Igreja: sexo nos seminários e pedofilia nas sacristias.

A exclusiva opção pelos pobres, surpreendentemente, empurrou estes para fora dos templos católicos, e motivou a perda de apoio das classes média e rica, formadoras de opinião.

Houve, na realidade, um afastamento da Religião de seus ancestrais.

 

SEGUNDO RENAN…

Ernest Renan (1823-1892) não acreditaria no que hoje ocorre, pois concluiu, em sua época, o seguinte: “Sente-se desde então que o espírito da Igreja nas coisas humanas será uma espécie de bom-senso médio, um instinto conservador e prático, uma desconfiança das quimeras democráticas, contrastando estranhamente com a exaltação de seus princípios sobrenaturais” (“Origens do Cristianismo, O Anticristo”, p.196).

 

DIMINUIR POBREZA

Félicité de Lamennais (1782-1854), religioso dissidente, em suas “Palavras de Um Homem de Fé”, lançou uma advertência que não pode ser ignorada por pretensos reformadores: “Não é tomando o que a outro pertence que se pode destruir a pobreza, pois como diminuiria o número de pobres criando-se pobres?”.

(*) ANTENOR DEMETERCO JUNIOR, advogado, desembargador aposentado do TJPR, estudioso da história do século 20.

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