domingo, 6 julho, 2025
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Na CNT, “igrejas eletrônicas” darão lugar a conteúdo secular

Flávio Martinez
Flávio Martinez

A Rede CNT, Canal 6, fundada por Oscar Martinez, morto no ano passado, teve momentos áureos de laicidade, nos seus primeiros dias, no começo dos 1970s e partir dos 1980. Depois, com o passar dos anos, a Rede OM de Comunicação (Oscar Martinez) foi sendo identificada como rede de televisão voltada quase que exclusivamente a uma programação das chamadas “igrejas eletrônicas”.

Perdeu audiência, de um lado; ganhou, de outro.

Um pastor paranaense, batista, Nilson Fanini, que ganhara do general Figueiredo a concessão da TV Corcovado, do Rio, acabou, com o passar dos anos, sem experiência no ramo, entregando sua emissora à CNT, o que ajudou a solidificar a ação da OM no vital Rio de Janeiro.

IGREJAS ELETRÔNICAS

O grupo Martinez, de lá para cá, sobreviveu até aqui com mensagens evangélicas, hoje tendo grande parte de sua grade vendida à Igreja Universal do Reino de Deus.

Mas houve tempos em que dezenas de igrejas, megas, pequenas e micros insistiam numa pregação de “salvação”, milagres e curas, tudo acompanhado de fortes apelos de doações financeiras.

Dinheiro e reino dos céus, esta foi uma forma que os modernos evangélicos recolheram da experiência católica de triste lembrança, historicamente identificada com a venda de Indulgências, no século 16. Dessa cobiça pelo “esterco de Satanás” alimentada por Roma, nasceu a Reforma de Lutero, lembram-se?

GRANDE TEMPLO

A rede – que é aberta -, na prática é um grande templo religioso, atingindo, segundo avaliações de fonte do grupo OM cerca de 66 milhões de telespectadores diariamente, estando presente em 22 capitais de Estado.

Quem olha meio atravessado para a importância da Rede OM talvez assim aja porque não sabe de sua extensão: hoje a CNT, com cabeça de rede em Curitiba, compreende geradoras de programação em Curitiba, Londrina, Caxias do Sul, Americana, Rio de Janeiro e Salvador. Outras estão sendo planejadas.

TEMPOS DE KOTSCKO

Jornalistas veteranos lembram-se bem de quanto a CNT chegou a preocupar a concorrência: foi quando, nos anos 1980, com o jornalista Ricardo Kotscko, um dos profissionais mais representativos de um jornalismo de qualidade no Brasil, comandava a bom o Departamento de Notícias da rede a partir de Curitiba.

Kotscko mudou-se para cá e trouxe parte de sua equipe de São Paulo para dar o tom de um moderno e investigativo noticioso diário. O nome dele dava prestígio à rede CNT e os resultados que sua ação garantiram, naqueles dias, bons patrocinadores para a emissora.

FUNDAMENTALISMOS

Alguém dentro da rede OM – seu departamento de Marketing, possivelmente – captou com precisão as mudanças que iam ocorrendo na sociedade brasileira. A mais significativa delas, na minha opinião, o avanço das igrejas pentecostais e neopentecostais (a partir dos 1980, de que é exemplo clássico a Igreja Universal, de Edir Macedo, dono da Rede Recorde de Televisão, entre outros negócios importantes e nacionais).

“BÍBLIA NÃO ERRA”

O fundamentalismo religioso, aprendido com a escola dos protestantes americanos, e baseado na chamada inerrância da Bíblia (quer dizer, a Bíblia não erra), foi o ponto de partia para a chamada “desromanização” (afastamento de Roma) de boa parte dos brasileiros.

Interpretar as Escrituras ao pé da letra, sem qualquer exame crítico, sem exegese rigorosa, passou a ser a sopa no mel para a geração para os novos evangelizadores que foram minando o campo católico.

A falta de agressividade no evangelismo católico, a acomodação do clero, a excessiva vinculação da Igreja a teses de cunho sociais em detrimento do litúrgico-religioso, tudo isso teria dado uma enorme mão ao avanço do chamado “mundo crente”. E daí à descoberta do filão das igrejas eletrônicas não demorou muito a ser assumido pela CNT.

MUNDO RURAL

Numa breve abordagem sobre a rede CNT, importante pela peculiaridade que ela tem na história da televisão brasileira, há que considerar ainda: Grupo OM foi beneficiado também pelo êxodo rural, e pela consequente vertiginosa urbanização de enormes áreas do país.

Assim, a verticalização das cidades, a ruptura com os pontos de referência dos antigos moradores do campo passando a viver nas periferias pobres da grande cidade, tudo isso ampliou a “explosão pentecostal”. E facilitou a criação de um mercado-ouvinte mais ou menos cativo da CNT.

“VAI MUDAR LOGO”

Outra fonte ligada ao grupo OM – que, por motivos óbvios, pede anonimato – apresenta um olhar animador para futuro próximo: “Até 2018 a CNT terá de estar totalmente digitalizada. Investirá R$ 300 milhões no processo que tornará obsoleto tudo da rede, com exceção das torres. Todo o resto virará sucata”.

Mas a grande novidade, além da digitalização obrigatória da CNT é a possibilidade – muitas vezes deixada clara por dirigentes da rede – de que, com as mudanças técnicas, o Grupo OM Comunicação passará investir em conteúdo diversificado. Isso quer dizer: competirá com as outras redes, podendo até manter alguns espaços religiosos. Mas será fundamentalmente uma rede aberta, de cunho secular.

CAPITAL ESTRANGEIRO

Observadores da área admitem que redes de televisão como a OM, assim como outras pequenas, como Rede Vida, Canção Nova, TV Aparecida, dentre outras, estão de olhos abertos para a possibilidades de ampliação da entrada de capital estrangeiro em televisões do Brasil.

Hoje a rede OM-CNT é basicamente tocada por Flávio Martinez e seus filhos, e os sobrinhos, filhos de José Carlos Martinez (in memoriam).

O patriarca Oscar Martinez, bispo Edir Macedo e Martinho Lutero
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