Por Raul Urban* – Com a proximidade de dois feriados nacionais – o primeiro, neste dia 15, que comemora a Proclamação da República, e que cai num fim de semana; o segundo, dia 20, Dia da Consciência Negra -, curitibanos e turistas que visitam a cidade dispõem de um programa, no mínimo, diferente do tradicional: o de circular, no centro ou nos bairros, em ruas hoje de destaque, mas que no correr do tempo ganharam nomes novos, frutos das mudanças históricas, ou mesmo de interesses políticos.
A cena é uma mesma Curitiba vivida em dois cenários distintos, ou melhor: o primeiro, ainda na segunda metade do século 19; o segundo, no século 20. Imagine-se o cidadão, no primeiro momento, fazer um longo passeio que começa na região do atual bairro São Francisco, e se estende até o Rebouças. A caminhada começa após a compra dos já tradicionais pães vendidos na Padaria América, da Família Englehardt, que fica na rua homônima. A caminhada, cansativa, porque a região é acidentada, leva à imensa praça defronte à Igreja do Rosário, no Setor Histórico, espaço que também abriga a sede da Sociedade Garibaldi.
Refeito do cansaço, o cidadão com mais idade inicia a descida rumo ao centro da cidade pela Rua do Jogo da Bola, trecho que os da geração seguinte identificam como sendo a Rua da Assembleia, por onde descem os bondes puxados por mulas, depois elétricos, e onde um deles, num determinado momento da História, provocou acidente ao atingir um veículo que trafegava numa rua transversal.
Esse percurso termina, quando o cidadão chega ao Largo da Ponte, onde dobra à direita e, acompanhando o Largo, anda não mais que cerca de 100 metros na Rua Carioca de Baixo – mais tarde, Rua do Commércio. Depois de atravessar a via, dobra à esquerda e anda por um longo trecho da ainda estreita Rua Ratcliff, até chegar ao cruzamento com a Rua Ivaí, por onde, no final da jornada, alcança seu destino e onde mora – em frente ao Campo da Cruz.
Guia de ruas no século 21

Em pleno século 21, o curitibano ou o turista curioso em conhecer essa extensa região refaz a caminhada. Mas precisa, com certeza, de um antigo guia de ruas para compreender as transformações urbanas e, em particular a mudança de nome das vias. O ponto de partida, em relação ao roteiro anterior, mudou e fica uma quadra adiante. A Padaria América ainda existe, controlada pela família Engelhardt, mas há muito tempo deixou o imóvel que originalmente ficava na esquina das ruas Paula Gomes e América (esta rua que deu nome ao estabelecimento), e continua ativa no entroncamento das ruas Carlos Cavalcanti (ex-Rua do Serrtito) e Trajano Reis (originalmente Rua América).
A subida em direção ao centro, com rápida parada para tomar fôlego, continua relativamente íngreme, mas o cidadão se depara com a Praça Garibaldi, que pouco mudou com seu casario colorido, a sede da Sociedade Garibaldi, a Igreja do Rosário e o monumento popularmente conhecido como “cavalo babão”, em frente ao Palacete Wolf, antigo quartel, depois sede da Fundação Cultural de Curitiba.
Nosso convidado ao passeio sobe em direção à Alameda Doutor Muricy (ex-Rua da Assembleia) – mesmo que desprovida das árvores que justifiquem a “alameda”, seguindo pelo forte declive que termina na altura do cruzamento com a Rua Cruz Machado (que no passado foi Rua do Thesouro). Já na planície, o passeio segue em frente e leva à Praça Zacarias, onde, dobrando à direita, faz breve passagem no pequeno trecho da Rua Marechal Deodoro (ex-Rua do Commércio).
Depois de atravessar essa rua, dobra à esquerda na Rua Desembargador Westphalen (a antiga Rua Ratcliff), e com longas passadas, quadras adiante, chega à Avenida Getúlio Vargas – a antiga Rua Ivaí. Depois da travessia nesse cruzamento, ainda pela avenida, o destino leva à suposta residência do nosso caminhante, defronte à Praça Ouvidor Pardinho, que no passado distante não passava de um modesto Campo da Cruz, sem qualquer infraestrutura, mas tendo como paisagem próxima a até hoje existente Igreja Sagrado Coração.

*Raul Urban é jornalista, escritor, memorialista, pesquisador da memória histórica e ligado à área do transporte multimodal integrado e colaborador do Mural do Paraná.
