
O promotor do Ministério Público do Paraná, Inácio de Carvalho Neto, negou pedido para uma pessoa transgênero, que nasceu mulher, para que mude os documentos pessoais e seja reconhecida pela sociedade como homem.
O caso corre na Vara de Registros Públicos de Curitiba. A mulher, Nathan Kirschner Tatsch, fez o pedido porque, segundo ela, nunca se identificou como mulher e gostaria de ser tratada como homem. O processo não identifica se Nathan teria a intenção de trocar de sexo. De qualquer forma, o promotor já antecipou que não lhe autorizará a documentação, mesmo que isso ocorra.
NEGATIVA SISTEMÁTICA
Carvalho Neto tem negado sistematicamente todos os pedidos que chegam às suas mãos que requerem a autorização para que transgêneros mudem de identidade. Ele é o único promotor autorizado para analisar esses casos em Curitiba.
Sua posição é inflexível. Para ele, a troca é “juridicamente impossível”. O documento foi divulgado no facebook pelo advogado de Nathan.
“O pedido de mudança de gênero feminino para masculino contraria frontalmente o ordenamento jurídico, sendo judicialmente impossível, eis que o gênero de cada indivíduo é determinado pelo médico no momento do nascimento, não sendo passível de alteração posterior”, afirma.
TROCA DE SEXO
É possível inferir que há, por parte do promotor do MP, uma orientação religiosa que influi nas suas decisões. Neto afirma, por exemplo, que nem uma eventual cirurgia para a troca de sexo seria suficiente para que a mudança de gênero nos documentos da pessoa fosse autorizada.
“Ainda que a requerente venha a realizar a cirurgia para a troca de sexo, essa cirurgia irá lhe atribuir um sexo que não tem e nem poderá ter, pois trata-se de uma cirurgia cosmética, não alterando seu sexo jurídico, não havendo que se falar em sexo masculino, eis que não há mudança completa dos órgãos internos, mas uma mudança meramente externa”, diz.
Ele ainda acredita que isso configuraria crime, de acordo com o Código Penal, já que o procedimento “pode acarretar na inutilização aparentemente da função reprodutora”.
A ‘INSTITUIÇÃO’ MP NÃO COMPACTUA COM A DECISÃO
O Ministério Público do Paraná não compactua com a decisão de Inácio de Carvalho Neto. Em nota divulgada no início da noite de ontem, o MP afirmou que, “institucionalmente” apoia pedidos de retificação no registro civil, independente da realização de cirurgias para a mudança de sexo.
O fato, no entanto, é que cabe a Carvalho Neto decidir sobre esses casos. Só em Curitiba, dois pedidos para mudança de gênero chegam às suas mãos, e elas são negadas sistematicamente. Dados da Organização Mundial de Saúde mostram que os nascimentos de transgêneros em todo o mundo representam menos de 1%.
A OMS admite, também, que há distorções.
Nem sempre uma pessoa que se identifica com o outro sexo é mesmo um transgênero. É necessário um laudo médico e um acompanhamento psicológico.
CRISTÃO CONSERVADOR
A repercussão do caso surpreendeu o promotor. Após se dispor a dar uma entrevista para uma agência de Brasília, ele viu a notícia espalhar-se e aumentar a demanda por entrevistas. Nas redes sociais, Carvalho Neto, não nega: é um cristão conservador e segue a orientação da igreja no que se refere a gênero e também no que se refere a sexo quando não destinado à reprodução.
A decisão do promotor, no entanto, não deixa de ser a expressão de uma sociedade conservadora que nem sempre vê com bons olhos os incansáveis estímulos de diversidade, de transposição de gênero e por algo que vai além do núcleo família constituído, cerne da sobrevivência da espécie na concepção darwiniana. Vale uma reflexão.
