Por Leomar Marchesini* – Quando me perguntam há quanto tempo trabalho com inclusão de pessoas com deficiência, acho até graça, pela “antiguidade no posto” que tenho nesta área.
Comecei quando o então Secretário de Estado da Educação do Paraná, o saudoso e insubstituível Prof.º Reverendo Elias Abrahão, me convidou para fazer parte de sua equipe e me nomeou chefe do Departamento de Educação Especial (DEE) daquela Secretaria, por decreto assinado pelo governador Roberto Requião, em seu primeiro mandato de governador do Paraná.
A minha designação para o DEE continha uma proposta de grande relevância: a criação de um Serviço de Atendimento para “alunos com distúrbios emocionais”. Foi a nomenclatura usada por Elias, em sua genialidade. Este Serviço de Atendimento Educacional ainda não existia na rede pública de educação, do Paraná e de todo Brasil. O que o Secretário me disse naquela ocasião foi: “Você tem a incumbência de criar o atendimento especial no Paraná, para aqueles alunos que não permanecem nas Escolas. Que são expulsos de uma para outra, seguidamente, até que se evadem para sempre.”
Realmente, as estatísticas demonstravam o que o Prof. Elias dizia. Com este compromisso ingressei no DEE – naquela época um grande departamento com sessenta e três professores especializados, ocupando um andar inteiro do prédio, e iniciei o trabalho de criação. E conseguimos.
Fundamentados solidamente na Constituição Brasileira, na declaração de que a educação é um direito de todos. Se a Educação é um direito de todas as pessoas, ficava claro que aqueles alunos, repudiados pelos seus mestres sob alegação de não conseguirem trabalhar com eles em sala de aula, também tinham direito a permanecer nas Escolas, apesar de seu comportamento divergente. Expulsões não constituíam a solução. O que tínhamos que fazer era entender como eles funcionavam psicologicamente e/ou neurologicamente e desenvolver um atendimento educacional diferenciado e especializado para eles, dentro da Escola.
Para tanto, capacitamos professores de todo o Paraná, em turmas de duzentos a trezentos docentes. Organizávamos cursos que eram ministrados no antigo Cetepar, que ficava no Alto Boqueirão, próximo a Assintec, e que foi um grande espaço de treinamento. Os cursos eram organizados para regiões do Estado. Os professores chegavam de todos os lados, animados com a nova proposta educacional. Conseguíamos reunir várias áreas do conhecimento para falar sobre o funcionamento emocional de alunos com comportamentos divergentes. Professores especialistas, pedagogos, neuropediatras, psiquiatras, psicólogos e psicopedagogos, uma área em destaque naquela época. Recebi, em meu gabinete na Secretaria, até a honrosa visita do Prof. Jorge Visca, o argentino, papa e fundador da psicopedagogia. Ele quis conhecer o trabalho que fazíamos e que não existia na América Latina. Uma pena que não fiz foto deste encontro.
E foi assim que fundamos, na gestão de Elias Abrahão, o Serviço de Atendimento Educacional para Alunos com Distúrbios Emocionais, que posteriormente o MEC passou a denominar “alunos com comportamentos típicos de síndromes” e mais recentemente de “transtornos globais do desenvolvimento” e atualmente é conhecido como “deficiência psicossocial (segundo Sassaki) ou “Deficiência mental” (segundo Gurgel).
Segundo a especialista na educação especial no Paraná, a Prof.ª Eliane Terra, a criação pioneira deste atendimento no Brasil, influenciou os ditames da educação especial do Paraná, que passou a atender todas as diversidades que alunos apresentem, incluindo aqueles que apresentam “disfunções”, que não se constituem uma deficiência, mas precisam de um atendimento diferenciado na Escola.
Jamais poderei esquecer o privilégio de trabalhar com o Prof.º Elias Abrahão, Secretário de Estado da Educação do Paraná que nos proporcionou grandes capacitações, inclusive com especialistas belgas, que eram contratados e vinham até nós. Passávamos tardes conversando e ouvindo o saudoso Rubem Alves nas salas da Secretaria. Essa riqueza toda permanece em cada um que viveu e conviveu naqueles dias. Ouvi do próprio Rubem Alves, um dia em conversa pelo telefone, que Elias Abrahão é um Ipê amarelo na sua chácara. E uma saudade para todos que com ele trabalharam e o tiveram como amigo.
*Leomar Marchesini é professora universitária, fundadora e gestora há 20 anos do Serviço de Inclusão e Atendimento aos Alunos com Necessidades Educacionais (SIANEE) do Centro Universitário Internacional Uninter. Formada em Psicologia, tem pós-graduação em Psicodrama Pedagógico e em Metodologias Inovadoras Aplicadas a Educação.