
O final de semana foi recheado de análises, ensaios e reportagens sobre temas de forte apelo antropológico. E me interessam de perto.
Primeiro, sou lembrado, pela Folha de São Paulo e Estadão, que a Igreja Universal do Reino de Deus, de Edir Macedo, está completando 40 anos de existência. O bispo escreveu artigo na Folha, falando do sucesso de sua obra, o quê atribui a Deus, dá conta de vitórias como a recuperação de multidões de seres humanos tomadas pelas drogas e falta de objetivos na vida. Citou ainda a capacidade de envolver a força jovem, moços que vão se envolvendo com a instituição muito combatida, algumas vezes com bons fundamentos, outras, por puro preconceito contra qualquer iniciativa cristã.
PARTIDO DA IGREJA
Edir Macedo não fala do PRB, o partido que, sabe-se, é controlado por lideranças da Universal. A igreja, no entanto, nunca escondeu ter um projeto político para o Brasil. Um dos primeiros grandes alvos atingidos foi a eleição de Marcello Crivella, bispo aposentado da IURD, e sobrinho de Edir, para a Prefeitura do Rio de Janeiro.
O certo é que a IURD é uma potência, não tanto pelo número de membros (ninguém sabe direito quantos são), mas pela capacidade de permeabilização que tem demonstrado até agora, envolvendo multidões em torno de suas pregações e sessões ditas de curas.
CLASSE MÉDIA
A IURD estaria com alvos bem definidos para estes dias. Um deles, conquistar seguidores na classe média, o que não significa que se desinteressará das camadas mais pobres (classe D) da população que formam seus quadros.
No Rio, por exemplo, conseguiu o feito de estabelecer um templo num dos pontos mais valorizados do bairro do Leblon. Em Curitiba, não esquecer, constrói um mega templo no espaço que outrora foi a fábrica do Mate Leão, e em São Paulo já tem o Templo de Salomão, empreendimento de R$ 600 milhões. Para se conhecer a gigantesca estrutura, paga-se entrada.
Nos cultos, a entrada é livre.
ANTES, OS DEMÔNIOS
Quem acompanha a já ampla bibliografia existente no Brasil, produzida especialmente pela academia, sabe que a Universal de hoje não é tão enfática quanto foi até anos recentes, no combate às religiões de matrizes africanas. Nem mais centra-se exclusivamente no ‘combate aos demônios’. Novos ares teológicos marcam a instituição dona da Rede Recorde de Televisão (na verdade, a rede oficialmente é do bispo Macedo).
PRIVILÉGIOS
Hoje, embora muito preocupada ainda com os “privilégios dados pelos governos à Igreja Católica”, os milhares de pastores da Universal partem para uma ‘nova canção’: a ordem é valorizar o espírito de empreendedorismo do brasileiro, e trabalhar fortemente pregações de autoajuda. Isso, talvez, levando em conta o momento nacional, que leva milhões de “empreendedores natos” ao desespero. Afinal, o marketing religioso da IURD tem-se mostrado oportuno e eficiente nesses 40 anos de existência da Universal.
LUTADORES DA RENASCER
Pelo Nextflix vou descobrindo, em documentário, a existência nos Estados Unidos de igrejas que se voltam exclusivamente à “evangelização” pela promoção de lutas-livres e MMA.

O mesmo corre em São Miguel Paulista, São Paulo, e outros bairros, onde a Igreja Renascer (do casal de apóstolos Hernandes, aqueles que foram presos nos Estados Unidos por chegarem a Miami com dólares não declarados) faz pregações, orações e aglutina gente em torno do desforço físico. “Tudo na porrada, dosado com orações e evangelização”, diz um lutador que se chama Zé, mas que quer ser conhecido como “Zé Reborn”, o renascido. Um “born again”, como os neoconvertidos pentecostais se declaram nos Estados Unidos.
AS COTAS RACIAIS
O fim de semana e a segunda-feira, 10, me presenteiam ainda com outros temas que se ligam fortemente à alma brasileira. O mais insistente deles, nos últimos dias, o das cotas raciais agora admitidas na USP, a última grande universidade (na verdade, a mais importante do Brasil) a aceitar essa proposta de inclusão das chamadas classes marginalizadas da sociedade em seus quadros.
QUEM É NEGRO?
Fico sabendo, também, que na UNESP, importante universidade estadual paulista, está às voltas com o desafio de evitar fraudes na admissão dos cotistas: dos 24 campus que a universidade mantém no interior de São Paulo, surgem queixas de fraudes, gente se autodeclarando indevidamente negro e pardo para ganhar o benefício dos bônus para admissão.
As cotas da USP destinam percentual aos oriundos de escolas públicas.
EXAME RACIAL
Há gente séria, como frei David, da Educafrica, ONG que batalha pela inclusão dos negros e pardos na educação superior, que defende os chamados exames de identificação dos candidatos às cotas. Ele, e muitas instituições envolvidas na questão, até acham que a auto declaração por parte do candidato, deveria bastar. Mas não basta, as fraudes são muitas. A UNESP já previu até cancelar a matrícula de fraudadores.
DIVISÃO EM RAÇAS
Cada vez é mais insistente a afirmação, por parte de cientistas de todas as áreas – menos os sociólogos, é certo – de que a humanidade não está dividida em raças. Que isso é herança obsoleta, “porque sabemos que raças humanas não existem como entidades biológicas”, diz à coluna um geneticista paranaense.
SE NÃO EXISTE…
Velho professor aposentado de Sociologia da UFPR, que pede anonimato – opina com outro olhar:
– Se não existem raças, também não existiria racismo…”
COTAS PARA POBRES
Num país em que pelo menos 55% da população é visivelmente negra ou descendente de africanos, acho justo que se criem medidas de apoio à inclusão dessa multidão à universidade.
Mais do que a dita cota racial – o importante é que se criem cotas sociais.
Explico: por exemplo, nos estados do Sul do Brasil, a população negra ou parda ou índia é pouco representativa numericamente. Em certas cidades do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, praticamente não existem negros, índios e pardos. Mas sobram brancos pobres, vivendo à margem dos benefícios da sociedade abrangente.
Prometo voltar ao assunto, logo.