Por Eloi Zanetti* – O ano era 1982. O poeta Mário Quintana havia se candidatado a uma vaga na Academia Brasileira de Letras e foi espinafrado por alguns setores da área – um cartunista famoso chegou a chamá-lo de poeta menor. Fiquei indignado: eu era gerente da Umuarama Publicidade – agência que cuidava da conta do Bamerindus. Liguei para a Tereza de Souza que fazia as composições dos jingles e trilhas do banco.
— Tereza você viu o que fizeram com o Mário Quintana?, perguntei.
— Vi e estou indignada.
— E o que a gente pode fazer para resgatar a dignidade do poeta, principalmente no Rio Grande do Sul?
Ela rapidamente lembrou:
— Temos um comercial de rádio, gravado pelo Gianfrancesco Guarnieri já há algum tempo e com um poema dele chamado “As Ruas de Porto Alegre”.
Localizei o jingle e liguei para o Ênio Belwanger, na época diretor comercial do Jornal Correio do Povo, onde o Quintana trabalhava há vários anos
— Ênio, preciso falar com o Mário Quintana, como é que faço?
— Está na minha frente. Quer que te passe?
— Sim!
E expliquei ao poeta que o Bamerindus desejava distribuir pôsteres com o seu poema sobre as ruas de Porto Alegre e divulgar o jingle nas rádios locais. Ele gostou da ideia. Perguntei sobre o valor cachê. Ele me respondeu:
— Não sei fazer preço para isso, me ajuda a pensar.
Respondi: “O que o senhor está precisando no momento?”.
— Preciso ir a Buenos Aires visitar uma sobrinha.
Propus o seguinte acordo: “O Banco paga toda a sua viagem – passagens, hotel, alimentação, deslocando e mais um pouco. Está bem assim?”.
— Fechado, o poeta me respondeu.
Ele me enviou o poema escrito em próprio punho e assinado. Mandamos imprimir cinco mil pôsteres para serem distribuídos nas agências e ao mesmo tempo colocamos o jingle nas rádios – foi um sucesso. Em alguns dias tivemos que fazer mais duas edições.
Tempos depois eu estava conversando com o Ênio na sede do Correio do Povo quando entrou na sala o Mário Quintana e o Ênio me apresentou — Este é o rapaz do Bamerindus que fez aquela propaganda de rádio com o seu poema. O Mário me perguntou na hora — E por que vocês não fizeram também na televisão? Eu disse — Não queria invadir a sua privacidade. Há tempos um cineasta filmou seu apartamento e o senhor não gostou, achei que não deveria lhe incomodar. Ele respondeu — Não, vamos fazer para a TV, também.
Perguntei: “E quando a gente pode filmá-lo?”. Fui pego de surpresa porque ele foi pronto na resposta.
— Amanhã está bom.
— Sim, a que horas?
— As seis da manhã. É quando saio para passear.
— Ótimo respondi, uma equipe de filmagens irá pegá-lo em seu hotel (ele sempre morou em hotel).
Liguei para o Sergio Serres, diretor de comerciais da TV Guaíba:
— Serres, temos na mão o Mário Quintana e uma trilha genial para filmá-lo andando pelas ruas de Porto Alegre – reúna uma equipe para filmá-lo amanhã às seis horas. Depois a gente combina o custo. Naquela época ainda havia esta confiança entre cliente e fornecedor.
O Serres gerou um belíssimo vídeo e, este, ajudou muito o poeta que começou a aparecer mais na impressa, a ser convidado para eventos literários e feiras e até a virar nome de ruas e praça.
E nós, ganhamos mais de dez prêmios publicitários, como o dos Profissionais do Ano da Rede Globo, do Clube de Criação, o Galo de Ouro, entre outros. Tempos depois fizemos outro trabalho – a colocação de vários poemas nos tótens dos recém-inaugurados pontos de ônibus expresso em Curitiba.
*ELOI ZANETTI, publicitário, escritor, conferencista. Foi um marco na publicidade do do país, ao lado de Sergio S.Reis, comandando a Umuarama Publicidade, “house” do Banco Bamerindus.