Por André Nunes
O teatro realmente opera magias no público, elenco, staff e em toda a cadeia de produção que torna possível um espetáculo acontecer. Arte e cultura são indústrias motrizes de um país, apesar de alguns ditos gestores não as enxergarem assim.
Hamlet, do grupo peruano Teatro La Plaza, encantou o público que lotou o Guairão na noite desta segunda (28), para prestigiar a abertura do 31º Festival de Curitiba. Um encanto justamente pelo lado mais potente e singelo das artes cênicas: a empatia.

Ninguém é igual a ninguém, nem deveria copiar um modelo pré-existente. Por que então um grupo de oito artistas multiperformáticos com síndrome de Down deveria usar qualquer modelo que se conheça de contar a tragédia clássica de Shakespeare?

Com um texto repleto de ironias, reflexões e quebras da quarta parede, este Hamlet envolve a plateia e supera tanto a barreira do idioma (o espetáculo é encenado em espanhol, com legendas na tela ao fundo), quanto os entraves entre neurotípicos e pessoas com síndrome de Down.
O existencialismo de Hamlet também ecoa na vida dos oito artistas em cena, que conjecturam sobre suas vidas e papéis sociais. Dessa forma, o “ser ou não ser, eis a questão” ganha outras camadas nesta montagem cênica.

Afinal, o cromossomo a mais os torna mais dotados de empatia, sensibilidade e amor que muitas das pessoas neurotípicas. Isso sem falar na imensa capacidade de dedicação e superação, vistas por um Guairão de testemunhas.
Nas palavras da dramaturga e diretora da peça, Chela de Ferrari: “Historicamente, as pessoas com síndrome de Down têm sido consideradas um fardo, um lixo social. Que valor e sentido tem hoje sua existência em um mundo onde eficiência, capacidade de produção e modelos intangíveis de consumo e belezao paradigma do ser humano?”.

O espetáculo conta ainda com transmissões em vídeo, músicas, raps, projeções e uma série de intervenções – incluindo a participação do público – que tornam a experiência ainda mais imersiva. Aplausos para Octavio, Jaime, Lucas, Manuel, Diana, Cristina, Ximena e Alvaro!

A segunda sessão será nesta terça (29), às 20h30, e tem 95 minutos de duração.