terça-feira, 8 julho, 2025
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Eloi Zanetti: Redes sociais – não caia no canto das sereias

Odisseu (Ulisses), em sua jornada de volta para casa entre Troia e Ítaca é castigado por Posseidon e obrigado a atravessar inúmeros perigos no mar, entre eles por um estreito onde moravam as sereias, cujos cantos maviosos encantavam os marinheiros e esses, seduzidos, jogavam-se ao mar e eram devorados. Odisseu ordenou aos seus marinheiros que tampassem os ouvidos com cera e, para ele ouvir o canto sem se expor ao perigo, se fez amarrar ao mastro dando ordem para que não o soltassem por mais que implorasse. Assim passaram ilesos e ele foi o único mortal a ouvir tais cantos e permanecer vivo.

Segurem o homem que o assunto está vendendo jornal

Em 1962, um filme brasileiro – O Pagador de Promessas – fez enorme sucesso, inclusive ganhando a Palma de Ouro em Cannes. A história descreve um homem que para pagar uma promessa carrega uma cruz enorme até uma igreja em Salvador – não vou entrar em detalhes, é só para dizer que depois desse filme aparecerem vários Zés do Burro pelo Brasil – um deles no Paraná.

Trata-se de um homem que saiu das imediações de Ponta Grossa e carregou uma cruz até a Igreja do Rocio em Paranaguá. O jornal sensacionalista Última Hora aproveitou para cobrir a viagem e, todos os dias, publicava fotos e o trecho por onde o romeiro passava, o que ajudava a vender muito jornal. Criaram tal clima que as pessoas esperavam ansiosas os jornais nas bancas. Tudo ia bem até que um dia o Zé do Burro paranaense sumiu e, a cada edição o jornal indagava: Teria sido levado aos céus? Abduzido por um disco-voador? Abandonado a promessa? E, com tais indagações, as vendas aumentavam. Muitos anos depois, conversando com o editor da Zero Hora da época, o jornalista Cícero Cattani, perguntei o que teria acontecido com ele pelo caminho.

O Cícero sorriu e disse – “Estávamos vendendo muito jornal e a história não poderia parar tão cedo, recolhemos o homem num puteiro (O Mosquitinho) em Paranaguá e criamos o drama. Passado um tempo, devolvemos o mesmo à estrada – ele foi cumprir a sua promessa e nós continuamos vendendo muito jornal.

Fato semelhante é retratado no filme A Montanha dos Sete Abutres (1954) – caso estudado hoje como o efeito Leo Mimosa.

E o que tem Odisseu, as sereias e o Zé do Burro a ver com isso?

Agora vamos ao que eu realmente quero dizer: desde o surgimento dos meios de comunicação de massa, de tempos em tempos, certas notícias ficam mantendo o interesse do povo por semanas, como é o caso das guerras, tragédias, assuntos de celebridades, política, vida de artistas, esportistas e jogadores de futebol. Notícias que depois de certo tempo, simplesmente somem. O interesse era mantido pela vontade e ação dos editores da mídia, no jargão dos editores – “manter a suíte”.

A saga de Zé do Burro na Itaú Cultural Play | Itaú Cultural
O Pagador de Promessas (1962)

Nosso tempo é roubado por algoritmos e não nos damos conta

O físico Sune Lehamnn – da Universidade Técnica da Noruega estudou sobre: como estamos perdendo a nossa capacidade de focar face a esta exposição exagerada e rápida dos conteúdos em redes sociais e, chegou à conclusão, de que não estamos sabendo controlar o uso da internet, pois  ficamos pulando de um assunto para o outro sem parar, ora é algum caso policial, outra sobre futebol, política, assuntos de saúde, de alimentação …e com isso, perdemos o foco sobre o que temos que realmente a fazer.

O volume de informações e a velocidade com que nos chegam a todos os momentos é assustador. É tudo programado e incentivado pelos provedores de conteúdo como o X, o Instagram, Face Book e outros para manter você preso a eles pelo maior tempo possível. É com a sua distração ao girar os seus dedos na tela do celular que eles ganham dinheiro – e como ganham.

É difícil sair desta armadilha porque “eles” sabem das suas preferências e oferecem aquilo que mais o atrai. Oferecem a isca e o seu precioso tempo é devorados pelos novos cantos das sereias – as redes sociais.

Meu conselho é nos proteger como Odisseu fez:  amarrarmos a um mastro e passar ao largo das redes sociais oferecidas nos celulares e PCs. Como a tarefa é quase impossível reserve estas atividades para uma hora pré-estabelecida do dia limitando o tempo de acesso para tais assuntos. Alguns podem ser de muito interesse e valia para você e sua profissão, mas a maioria são frívolos e inúteis. É preciso separar o joio do trigo.

*Eloi Zanetti é publicitário, referência em comunicação corporativa e empresarial, e colunista do Mural do Paraná. Contato: eloizanetti@gmail.com

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