segunda-feira, 18 agosto, 2025
HomeOpinião de Valor"Colapso do regime de Putin seria pesadelo para a China"

“Colapso do regime de Putin seria pesadelo para a China”

Análise é do cientista político Dirk Schmidt, professor de política e economia chinesa da Universidade de Trier

 

Agência DW

O cientista político Dirk Schmidt é professor de política e economia chinesa da Universidade de Trier. Em entrevista à DW, o especialista fala nos laços e dos pontos biográficos em comum unindo os líderes de China e Rússia em sua propalada “parceria sem fronteiras”, a qual foi enfatizada mais uma vez em recente visita do governante chinês a Moscou.

Schmidt diz que Pequim considera a Rússia necessária e crucial numa ordem mundial multipolar voltada contra os EUA e que as relações entre os dois países é nutrida pelos próprios interesses de ambos os lados. “A China está claramente seguindo seus próprios interesses e usa agora a situação na Rússia para obter gás, petróleo, carvão e recursos em geral a preços baratos”, explica o politólogo.

O especialista ressalta que Pequim tem “enorme interesse” de que a guerra na Ucrânia não termine em desvantagem para os russos. “Do ponto de vista chinês, seria um cenário de pesadelo absoluto se o governo de Putin caísse e, numa situação hipotética, a Rússia se juntasse ao Ocidente”, avalia.

DW: Professor Schmidt, pouco antes da invasão russa à Ucrânia, há mais de um ano, Pequim e Moscou já haviam concordado com uma “parceria sem fronteiras”. Recentemente, tais laços de amizade foram enfatizados mais uma vez durante a visita oficial a Moscou do chefe de Estado e líder do partido comunista da China, Xi Jinping. Até que ponto essa tão propalada amizade entre dois Estados é uma amizade entre dois indivíduos?

Dirk Schmidt: Acredito que a importância da amizade pessoal entre Putin e Xi é subestimada. A relação entre os dois países é moldada pelas convicções pessoais de seus líderes. Ambos estão ligados por uma proximidade particular, diria até amizade. Este mesmo termo foi inclusive usado durante a visita oficial. Quando eles se sentaram um de frente ao outro, Xi Jinping, que é certamente alheio ao sentimentalismo, colocou da seguinte forma: “Presidente Putin, meu grande amigo.” Foi exatamente isso que ele disse em chinês. Trata-se de uma qualidade especial e não apenas uma frase vazia.

O presidente chinês, Xi Jinping, ao lado do presidente russo, Vladimir Putin, num encontro no Kremlin, em Moscou, Rússia, em 20 de março de 2023.
Xi e Putin: dois vizinhos, dois chefes de Estado, dois autocratas, dois amigos

Em sua primeira viagem ao exterior como chefe de Estado em 2013, Xi Jinping foi a Moscou. Já naquela época, Xi Jinping disse a Putin acreditar que eles tinham um “caráter semelhante”. Ele chegou a falar inclusive de uma espécie de alma gêmea. De onde vem isso?

Existem alguns paralelos em suas biografias: ambos são da mesma geração, com apenas alguns meses de diferença de idade. Ambos cresceram num sistema marxista-leninista. Ou seja, Putin entende a mentalidade de Xi na estrutura do Partido Comunista.

Por outro lado, Xi Jinping tem uma compreensão da história russa, algo que Putin sempre promove. Xi é filho de um dos colaboradores mais próximos de Mao [Tsé-tung]. Seu pai, Xi Zhongxun, era um dos principais funcionários no âmbito das relações com a Rússia. Em entrevistas, Xi relatou repetidas vezes também ter sido influenciado pela literatura russa quando criança, e que seu pai lhe trazia presentes da Rússia. Além disso, o pai de Xi Jinping, considerado extremamente pró-Rússia, foi perseguido como espião russo sob o regime de Mao na década de 1960.

Ambos também compartilham a experiência do declínio do sistema autocrático na União Soviética (URSS). Xi Jinping sempre criticou o colapso da URSS, desde o início de seu mandato até os dias atuais. Putin e Xi têm uma visão idêntica sobre o fim da URSS. Do ponto de vista tanto de Putin como de Xi, essa queda se deve à incompetência do ex-líder soviético Mikhail Gorbachov.

Outro aspecto em que ambos compartilham uma perspectiva semelhante é a preocupação com as chamadas “revoluções coloridas” trazidas de fora para seus respectivos sistemas, seja dos EUA ou do Ocidente como um todo.

Leia a entrevista na íntegra

Leia Também

Leia Também