Por Jennifer Manfrin* – Um jovem de 12 anos entra em casa e, reunindo toda a sua coragem, conta à sua mãe que há alguns meses vem sofrendo bullying na escola. Indignada, a mãe vai conversar com a diretora, que promete que os agressores serão advertidos. A situação, contudo, só piora e as ofensas e humilhações que antes eram apenas pessoais ganham o mundo virtual, pois escondidos atrás de seus teclados, os agressores se sentem livres para continuar destilando o seu ódio com a confiança de que não haverá consequências.
Este poderia ser o enredo de um filme da “Sessão da Tarde” no estilo “os humilhados serão exaltados”, no qual o nerd tímido supera todas as dificuldades e se torna o rei do baile. Pensando por esse lado, talvez esse tipo de filme tenha contribuído para termos a falsa impressão de que o bullying é algo normal, que a vítima precisa superar para se tornar alguém melhor.
Você pode estar pensando: “mas eu sofri bullying na escola e consegui superar sem nenhuma cicatriz ou trauma”. Mas a verdade é que, infelizmente, esse nem sempre é o “fim do filme”. Com uma rápida pesquisa na internet, é possível perceber que esse inimigo não é inofensivo como parece. Ele leva muitos jovens a tirarem as próprias vidas diante da dor e do desamparo.
As experiências passadas e a falta de noção sobre o tamanho desse problema é o que faz muitos pais e responsáveis considerarem o bullying como uma simples “brincadeira de mau gosto”. Até mesmo no ambiente escolar, local em que se espera encontrar pessoas esclarecidas sobre o tema, é comum vermos diretores e professores apenas fecharem os olhos para os fatos e torcerem para que as situações se resolvam com um milagre.
Esse cenário fez com que, nos últimos anos, muitas vítimas propusessem ações judiciais cíveis com o objetivo de responsabilizar escolas, faculdades e pais de alunos que, mesmo diante dos insistentes alarmes de alerta, nada fizeram. O único milagre que temos visto, portanto, é a multiplicação das indenizações judiciais.
Porém, como nem mesmo o prejuízo financeiro tem sido o suficiente para conscientizar a população, agora Bullying e Cyberbullying são crimes com a entrada em vigor da Lei 14.811/2024, que modificou o Código Penal. Agora, todo aquele que praticar uma das condutas previstas no artigo 146-A, como intimidar, humilhar ou discriminar, terá que responder criminalmente, ficando até mesmo passível de ser condenado à reclusão.
Outros méritos dessa lei são aumentar em 2/3 as penas para homicídios praticados contra menores de 14 anos em instituições de educação básica (art. 121, §2º-B, III, CP), e dobrar a pena para o induzimento ao suicídio quando o autor é líder, coordenador ou administrador de grupo, ou comunidade virtual (art. 122, §5ª, CP).
Certo é, portanto, que o Direito acaba de ganhar uma poderosíssima arma contra o bullying. Entretanto, tão importante quanto criminalizar é continuar conscientizando a população sobre os efeitos nefastos desse tipo de conduta, especialmente porque “simples brincadeiras” não levam ninguém à morte.
*Jennifer Manfrin é advogada, especialista em Direito Aplicado e professora nos cursos de pós-graduação em Direito do Centro Universitário Internacional Uninter.