Folha
A vitória de Lula devolve Brasil ao palco internacional da negociação sobre a crise do clima, esvaziada com a Guerra da Ucrânia e a relevância estratégica readquirida por combustíveis fósseis. O presidente eleito promete desmatamento zero, demarcação de terras indígenas e repressão a garimpeiros, mas tem metade do país contra essas políticas civilizadas, retrospecto ambíguo na área ambiental e meios restritos de dar a contribuição devida para mitigar o aquecimento global.
Guardadas as proporções, a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva despertou otimismo similar às eleições de Barack Obama, em 2008, e de Joseph Biden, em 2020. Com governos não refratários à Convenção da ONU sobre Mudança Climática em potências do carbono como EUA e Brasil, ressurgiu a cada vez a esperança de que subsequentes conferências das partes signatárias (COPs) lograssem algum avanço nas negociações que seriam retomadas poucos dias ou semanas depois dos pleitos.
No caso de Lula e da COP27 no Egito, apenas uma semana, neste domingo (6). O presidente eleito deve comparecer à reunião de cúpula e já vai sendo festejado, mais por suceder o vilão ambiental Jair Bolsonaro que por realizações incontestáveis nessa seara (assim como Biden foi incensado por derrotar Donald Trump, guru do ainda presidente brasileiro).
Em seu sétimo ano de mandato, Lula esteve em Copenhague para a COP15, em 2009, e abriu seu discurso no plenário assim: “Confesso a todos vocês que estou um pouco frustrado. Porque há muito tempo discutimos a questão do clima e cada vez mais constatamos que o problema é mais grave do que nós possamos imaginar. Pensando em contribuir para a discussão nesta conferência, o Brasil teve uma posição muito ousada. Apresentamos as nossas metas até 2020”.

EMISSÕES NACIONAIS
As emissões nacionais atingiram 2,42 bilhões de toneladas equivalentes de dióxido de carbono (GtCO2e, medida equalizadora de todos os gases do efeito estufa). Fruto principalmente do desmatamento fora de controle nos biomas brasileiros, floresta amazônica e cerrado à frente, cuja devastação emitiu mais que o Japão, terceira maior economia do planeta. Originalmente, o país deveria chegar a 2030 emitindo 1,2 GtCO2e, portanto está 100% acima da meta inicial.
A estrela do presidente eleito brilhará no balneário Sharm el-Sheik, onde não terá responsabilidade maior que pontificar e reposicionar o Brasil como parceiro confiável no enfrentamento da crise climática. É no front interno, contudo, que necessitará de sua proverbial habilidade de negociação para resgatar o ambiente da vala comum em que foi atirado, nos últimos oito anos, por Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro.