segunda-feira, 23 dezembro, 2024
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DE QUANDO O DINHEIRO DEIXOU DE SER MALDITO

Jacques Le Goff 

Fui menino e moço que se criou meio ‘rato de biblioteca’. E também participando de debates de temas instigantes, em instituições como o Centro Liberal de Cultura, que se reunia, de 1954 a 1959, na Biblioteca Pública do Paraná.

Nos livros e nos debates, um dos temas que sempre surgia era o da chamada “Idade das Trevas”, como vulgarmente (e de forma simplista) era tratada a Idade Média por uma inteligência dita de vanguarda.

Muito desse tratamento, acredito, deveu-se a máculas inomináveis que a História registrou na Idade Média. A mais dolorosa delas a Inquisição, infelizmente pregada por ordens religiosas católicas, como a do padres Dominicanos.

“BRAÇO SECULAR”

Embora, ressalte-se, a Igreja tenha sempre alegado que encaminhava os processados para “o braço secular”. O que, na minha opinião, nunca isentou a instituição de tão grande culpa. A ponto, lembremos, que o santo João Paulo II pediu publicamente perdão aos que fizeram a Inquisição em nome da Igreja.

O tempo se encarregou, no entanto, de mostrar a Idade Média como anos de grande importância para a História. E essa “redescoberta” se deve a medievalistas, historiadores que pesquisam aqueles dias.

E dentre eles, o mais notável é o francês Jacques Le Goff, de quem comecei agora a leitura de Homens e Mulheres da Idade Média, uma amostra – personalizada – de notáveis que contribuíram em favor da Humanidade naquele período.

SÓ UM PRÉ-CAPITALISMO

Com vistas ao grande público, Jacques Le Goff faz uma instigante análise do papel do dinheiro nas sociedades medievais, na sua obra mais recente, editada no Brasil: A Idade Média e o dinheiro. Mostra, por exemplo, como a Igreja Católica influenciou a relação de seus fiéis com as diversas moedas existentes na época.

Segundo ele, “(…) o dinheiro, se deixou de ser maldito e caminho do inferno, continuou suspeito ao longo de toda a Idade Média. (…) Na Idade Média o dinheiro, como também o poder econômico, não se emancipou do sistema global de valores da religião e da sociedade cristãs. A criatividade da Idade Média está em outros pontos”.

 

Biblioteca Pública do Paraná, em Curitiba

SURGIMENTO DAS CIDADES

Le Goff afirma que embora o dinheiro tenha desempenhado um papel importante no surgimento das cidades e do comércio e na formação do Estado, ainda não havia o capitalismo na Idade Média, mas apenas um pré-capitalismo. E a ausência de um mercado verdadeiramente global.

É por isso que o desenvolvimento econômico se manteve lento e limitado, apesar de algumas histórias de sucesso notável.

De acordo com Le Goff, a Idade Média foi um período em que dar dinheiro era tão importante quanto ganhar. A verdadeira riqueza não era ainda a riqueza deste mundo, mesmo que o dinheiro tenha desempenhado um papel cada vez maior na realidade e nas mentalidades.

Jacques Le Goff é internacionalmente conhecido como um dos maiores medievalistas. Depois de ter publicado o seu primeiro livro publicado em 1956, Marchands et Banquiers du Moyen Age, ele continuou a explorar a mentalidade medieval, e mudou a história profundamente. A lista de suas obras e dos prêmios que já recebeu é impressionante, e seu entusiasmo permanece intacto.

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