quarta-feira, 5 novembro, 2025
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Marcus Gomes: É Natal na Venezuela

Nada mais contemporâneo do que um morador de condomínio vendo o mundo através da janela. É o seu mundo em particular. Cheio de nuances da civilização. Os prédios, os parques, os carros, as pessoas, os sons, o cheiro, o céu, a cor. É o primeiro dia de novembro e ele pode se deixar embalar pelas esperanças. “Que bom se hoje fosse Natal”, pensa. Pois na Venezuela é.

Em outubro, o presidente venezuelano Nicolás Maduro abriu o seu programa na TV estatal anunciando a antecipação da data festiva. Faz isso para, segundo ele, unir o povo, estimular a economia e “buscar a felicidade”.

A crise econômica na Venezuela é a pior enfrentada por um país desde meados do século 20. A nação está afundada em um poço de hiperinflação de 3.500%, fome, doenças, altas taxas de mortalidade – o número de suicídios quadruplicou – e êxodo de milhões de venezuelanos.

No comando do país desde 2013, Maduro tomou o lugar de Hugo Chávez e foi reeleito sucessivamente em eleições notadamente fraudulentas. Esse é o segundo ano consecutivo em que ele antecipa o Natal. Fez isso também durante a pandemia da covid-19 em 2020 e 2021. Suas excentricidades, porém, não param por aí.

No início de seu governo, ele relacionou a escassez de papel higiênico a supostas conspirações de empresários e da oposição. Em 2019, pediu o voto de um grupo de vacas para a Assembleia Constituinte e incentivou os venezuelanos a reservarem espaços nos apartamentos para acomodar galinhas. Na Venezuela, assim como no Brasil, os condomínios não podem proibir animais de estimação nas unidades residenciais. E ninguém tem nada com isso se os pets, por acaso, forem depenados e virarem canja.

Em 2014, o governante acusou o Homem-Aranha de ser um dos responsáveis pela crise de insegurança que assolava o país. Cinco anos depois, contou ter viajado para o futuro para descobrir que tudo estava “ótimo”. Diante das chacotas da imprensa internacional, ele reagiu mandando produzir e distribuir 12 milhões de bonecos de si mesmo incorporando o herói “Super Bigode”. Chávez, de quem Maduro se diz o legítimo sucessor, fez o mesmo em 2005, lançando uma coleção de Chavecitos fardados. Hoje o brinquedo custa 55 dólares no Mercado Livre (cerca de R$ 293).

Em julho, antecipando as ações de Trump, o presidente venezuelano taxou em 77% os produtos brasileiros, entre eles a soja e a farinha de trigo. O Brasil tem um superávit de R$ 4,3 bilhões com o país vizinho. Na adesão de Maduro ao Mercosul, ele se comprometeu a garantir tarifa zero para produtos exportados com certificados de origem. Se a América do Sul fosse um condomínio, a Venezuela seria um morador antissocial. Feliz Natal.

 

Marcus Gomes é jornalista e advogado. Escreve sobre política, direito, condomínios e assuntos do dia a dia.

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