Desde que deixou a publicidade, o empresário Roberto Justus, 70, procurava o que fazer. Achou. Ele irá investir no Minha Casa Minha Vida – projeto de construção de habitações populares do governo federal que tem sigla: MCMV. Justus é bilionário e celebridade da TV. Apresentou a versão brasileira de “O Aprendiz”, programa que alçou Donald Trump ao estrelato e à presidência dos EUA, e é o âncora de bobagens como “A Fazenda” e “Power Couple Brasil”. Todos eles realities shows comparáveis a uma lobotomia.
Há dois anos, Justus encontrou um novo filão no mercado: a indústria imobiliária. Conheceu uma empresa de construção industrializada na China e pensou que poderia explorar esse nicho. Casas pré-fabricadas, como as que Justus quer investir, são semelhantes a um jogo de Lego. Você encaixa uma peça a outra e, pronto, eis um lugarzinho para o pobre chamar de seu. É assim mesmo que o bilionário chama: “casa de pobre”. Reproduzo trecho da entrevista de Justus publicada na “Folha”: “A casinha pobre fica fria quando está frio e quando está quente, pega fogo”? O sistema da empresa de Justus resolve o problema. Barreiras térmicas nas paredes mantém a temperatura ambiente em 21 graus.
Justus está orgulhoso com seu novo empreendimento. Faturou R$ 80 milhões em 2023 e neste ano deve fechar em R$ 330 milhões. Ele é um otimista e tem razões para isso. O déficit habitacional do país é de 6 milhões de moradias. Justus descobriu a galinha dos ovos de ouro. Sua fábrica de pré-moldados produz uma casa de 40 a 54 metros quadrados em 80 minutos – mil casas por mês, 12 mil por ano.
Mas construir habitações populares não basta. A empresa de Justus, que para variar tem nome em inglês, também se tornou incorporadora. Compra terrenos em áreas periféricas das cidades e enche elas de casinhas enfiadas no barro vermelho. Com porta, janelinha e cachorro sarnento amarrado no cano d´água.
Justus diz que vai mergulhar de cabeça em programas como os da Companhia de Habitação de São Paulo e do MCMV. A empresa paulista é uma grande compradora e o Minha Casa Minha Vida nem se fale. Para erguer as residências, o governo federal, por exemplo, arca com até 90% do custo dos imóveis e o valor restante é quitado pelas próprias famílias. Em 20 anos. Talvez mais.
Ex-secretária executiva do Ministério das Cidades no primeiro mandato de Lula (2003-2006), a urbanista Ermínia Maricato afirma que os conjuntos residenciais construídos longe dos centros urbanos levarão décadas para se integrar às cidades. “Criamos o exílio na periferia”, diz.
Durante a ditadura militar (1964-1985), o Banco Nacional de Habitação (BNH) financiou a construção de 4 milhões de residências populares, grande parte em áreas suburbanas. Nada mudou. O MCMV segue a mesma política habitacional. “Sai governo, entra governo, não importa a bandeira do partido, esse mercado continua em expansão”, diz Justus. E ri à toa.
Marcus Gomes é jornalista e advogado. Escreve sobre política, direito, condomínios e assuntos do dia a dia.