Por Marilia Mesquita – Meu amor pelo futebol é um sentimento que veio de família, assim como acontece com muitos outros brasileiros. Minha família materna é composta por japoneses fanáticos pelo Corinthians, paixão que começou há décadas e segue por gerações. Além disso, meus tios disputavam campeonatos amadores de futebol em São Paulo e colecionavam medalhas e troféus. Eu também tentei a sorte no futebol de salão, mas meses depois descobri que meu maior rival era meu joelho. Depois de muita fisioterapia, desisti. Já era hora de focar no vestibular e o futebol precisava ficar para trás.
As minhas principais memórias futebolísticas sempre foram no masculino. Naquela época, eu não tinha nenhuma referência feminina dentro do esporte. Elas se destacavam em várias outras modalidades, mas nenhum outro esporte me agradava. Tentava jogar vôlei, mas era péssima. Não tinha altura para o basquete, não tinha talento para atletismo e nem para natação. Fiquei com o futebol mesmo, somente pela televisão. E depois de muito tempo, vi o futebol feminino ganhando um pouco de espaço.
Talvez, essa ausência feminina tenha uma justificativa. No país do futebol, Getúlio Vargas tornou ilegal o esporte para mulheres. Isso durou de 1941 a 1979. Um verdadeiro atraso. Isso, afirmo com certeza, tirou muito da nossa história dentro do futebol feminino mundial e nunca saberemos o quanto e nem quem eram as mulheres que ajudariam a construir esse caminho.
Mesmo com a liberação do futebol na década de 1980, o Brasil demorou para abrir as portas dos estádios para que as mulheres pudessem jogar. A Copa do Brasil de Futebol Feminino foi disputada pela primeira vez em 2007, sendo descotinuada em 2016, e retornando ao calendário oficial em 2025. Em 2013, o Campeonato Brasileiro de Futebol Feminino Série A1 foi oficialmente iniciado e se tornou a principal competição nacional feminina do país, ajudando a aumentar a qualidade do futebol feminino brasileiro.
Quatro anos depois, em 2017, a liga nacional ganhou uma segunda divisão, e em 2022, expandiu-se ainda mais, com a criação da Série A3. Inacreditavelmente, apesar dos problemas (leia-se pouco investimento e visibilidade) os clubes brasileiros são os mais vitoriosos da Copa Libertadores da América de Futebol Feminino, com onze títulos em catorze edições já disputadas.
E assim, conseguimos pavimentar um pedaço do caminho, no Brasil e no mundo, e o futebol está testemunhando uma transformação notável e inspiradora: a ascensão e o protagonismo das mulheres em todas as suas esferas. Longe de serem apenas coadjuvantes, elas estão redefinindo o esporte, quebrando barreiras e provando que a paixão, o talento e a capacidade não têm gênero, mesmo sem o espaço e investimento necessário e merecido.
Em 2023, tive a oportunidade de participar mais ativamente da Copa do Mundo de Futebol Feminino. Pela primeira vez como comentarista, precisei me aprofundar nas seleções e pude assistir ao maior movimento no que diz respeito ao futebol feminino. Naquela edição, disputada na Nova Zelândia e Austrália, homens e mulheres encheram os estádios e tomaram as ruas das cidades, torcendo por suas atletas em campo.
A seleção brasileira não teve o desempenho tão esperado. Obviamente, queríamos trazer a taça, mas a maior vitória foi a visibilidade e claro, o show que a torcida canarinho deu, mostrando ao mundo que a paixão pelo futebol e pela seleção é maior que tudo.
E o Brasil não parou por aí. Em maio de 2024, foi anunciado que seremos sede da Copa do Mundo de Futebol Feminino de 2027, sendo o primeiro país latino-americano a receber o evento. Eu vibrei. Vibrei demais. Pois isso representa muito para as mulheres. Talvez essa seja a maior oportunidade de mostrarmos para as nossas meninas que elas também podem. É trazer para a realidade dessas crianças um mundo de possibilidades dentro do esporte, fomentando a inclusão e inspirando as futuras gerações.
Num país como o Brasil, isso é um ato de resistência, uma revolução silenciosa Vai ter Copa Feminina, sim! E não importa o que pensem. O futebol feminino é uma realidade e não há possibilidade de retrocesso.
Nós estaremos dentro e fora do campo. Como jogadoras, juízas, técnicas, presidentes, preparadoras físicas, nas rádios, na televisão, nas redações e nas arquibancadas, torcendo e comemorando mais uma vitória das mulheres.
Pautas e contato: esporteedestino@gmail.com
*Marília Mesquita é jornalista e assessora de imprensa. Entende que a combinação de esporte e viagens oferece uma mundo de oportunidades para experiêncas únicas, nos conectando com a natureza, enquanto exploramos diversas culturas.