quarta-feira, 30 julho, 2025
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Prosa gastronômica: O “patinho feio” do arroz

Katia Michelle – Outro dia estávamos num boteco, quando o calor ainda dava as caras em Curitiba, e um amigo, olhando atravessado o cardápio, soltou: “Ah não, bolinho de arroz? Que comida feia!”. Pedimos.

Pode até não ser o prato mais bonito ou instagramável do mundo, mas ganharia disparado num concurso de miss comida em que o Rollmops estivesse participando. Bolinho de arroz é lembrança, é memória, é afeto. Tem licença poética para feiura. Se não der para ser redondo, tudo bem; se não ficar todo do mesmo tamanho, a gente perdoa. Só não pode ser insosso.

Deve ser quentinho, dourado, com gosto de quem sabe o que é roubar da travessa enquanto eles ainda estão sendo fritos. Sim, frito. Tem assado, tem vegano, tem vegetariano. Tem rosado, com arroz batido, com arroz de ontem, de anteontem, com legumes, tem na airfryer (mas fica bom mesmo é com aquela textura caramelo que só o toque do óleo permite).

Sua origem? Uns dizem que nasceu no Japão, outros na Itália. O certo mesmo é que surgiu da criatividade de usar as sobras (condição que deve ser respeitada com louvor em qualquer prato). Tanto que, no Brasil, foi das mesas das famílias para os botecos e até para os restaurantes mais badalados.

A verdade é que ainda não encontrei a receita perfeita ou o ganhador do Festival de Bolinho de Arroz que promovo na minha cabeça. Mas, vamos lá, quem quer perfeição quando se tem afeto e crocância? Faço com o que tem, com o que a imaginação permite. O que não é exatamente um problema quando a gente depende de sobra pra fazer bolinho.

Aliás, talvez seja exatamente por isso que o bolinho de arroz sobrevive ao tempo e às modas: porque não precisa ser bonito, nem certo, nem igual. Basta ser lembrança, improviso e encanto. Mas, como eu não preparei a receita recentemente nem fotografei o que pedimos no boteco, recorri à IA para gerar a imagem de um bolinho de arroz. Até que ficou bonitinho, né?

*Katia Michelle é jornalista formada em Comunicação Social e bacharel em Artes Cênicas. Trabalhou durante uma década na Folha de Londrina, passou pelo marketing de grandes empresas e foi editora na Gazeta do Povo. Aprendeu que comida é mais do que a junção de ingredientes e, desde então, vaga entre palavras e receitas, procurando o léxico, o sabor e o aroma perfeitos.

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