Azar o nosso que ficamos aqui com esse legado vexaminoso da imprensa poodle. Foram Paulo Francis – involuntariamente porque a morte o levou. E Diogo Mainardi, cansado de tudo. Em outro tempo, nesse buraco de mundo, alertei para o redemoinho que a mídia brasileira circunavegava. Eu mísero, por certo, mas o óbvio era ululante. Breve me impingiram apelidos jocosos. Ombusdman de botequim, pelego fascista e, meu preferido, jornalista vira-lata. Ah, eu não era um poodle? Que bom. Alguém cheirou meu traseiro.
Naquele tempo, o governo era petista, a oposição era tucano-fascista e eu havia entrevistado uma persona non grata no meio. Um tal de Reinaldo Azevedo, hoje, salvo engano, ministro do STF.
Pois leio coluna de esporte, na Folha de S. Paulo, e percebo que nada mudou. Juquim, a pretexto do jogo entre Flamengo e Bayern de Munique, decidiu que só devia duas linhas à partida. O resto do espaço seria preenchido com um confuso protesto contra a Copa do Mundo de Clubes nos EUA, contra a Copa do Mundo de seleções, em 2026, que também será realizada nos EUA (mais Canadá e México) e contra a tempestade de raios que obriga a paralisação de alguns jogos. Mas, repare, a favor do governo.
Na coluna, Juquim faz uma salada mista. Critica o Congresso Nacional por barrar a mudança de regras no IOF, ataca o genocídio promovido pelo Estado de Israel, defende o direito do Irã possuir bombas nucleares e considera que o presidente toma decisão acertada ao defender o jogo do “nós contra eles”. Alegoricamente, Juquim diz que tudo é uma questão de torcida e não foi ele, o presidente, quem inventou a luta de classes.
Parece confuso? E é mesmo. Juquim escreve em parágrafos curtos e joga ideias como quem joga entulhos no quintal alheio.
No “nós” contra “eles” de Flamengo e Bayern, é preciso dizer, os cariocas pensaram, alegoricamente, que venceriam por decreto arrecadando impostos para aumentar a gastança pública. Pena que, do outro lado, estava o time alemão, evidentemente perdulário quando se trata de gols. Fez 10 no Auckland e quatro no Flamengo, sem se deixar levar pelo atrativo imoral dos dribles e das emendas parlamentares.
Filipe Luís, o técnico do Flamengo, bolou um esquema em que era tudo ou nada. Com 100% de probabilidade de dar em nada. O time partiria para a frente, seguindo seu estilo, sem se preocupar com o que viesse às suas costas, cheirando, daquele jeito, a retaguarda alheia. Em dez minutos, “eles” (ou “nós”?) fizeram dois a zero. E dobraram. O time carioca respondeu. Fez dois. Porém, sem ameaçar a postura inabalável do Bayern. “Eles” (ou “nós”?) jamais cogitaram perder a perdida. Para o Flamengo, sobraram as boas intenções. Mas de boas intenções, arre, o inferno está cheio.
Quanto aos leitores de Juquim, raros, ficou a sensação de que o jornalista deveria ter escrito uma coluna de esporte. Em vez disso, preencheu uma lacuna com um vazio.
Marcus Gomes é jornalista e advogado. Escreve sobre política, direito e assuntos do dia a dia.